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ENCRUZILHADA

Banco Central sobe juros. Quem Lula irá culpar agora?

Na última semana, o Comitê de Política Monetária da instituição decidiu aumentar a taxa básica de juros em 0,25%, marcando a primeira alta durante o governo

por Tiago Mitraud em 25/09/24 15:04

Presidente Lula (PT) durante conversa com líderes belgas | Foto: Ricardo Stuckert/PR via Flickr - 18.07.2023

Na última semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu aumentar a taxa básica de juros em 0,25%, marcando a primeira alta durante o governo Lula. A decisão foi unânime, contando inclusive com os votos dos 4 diretores indicados pelo atual governo, entre eles Gabriel Galípolo, o escolhido por Lula para suceder Roberto Campos Neto na presidência do BC a partir do próximo ano.

O Banco Central, especialmente Campos Neto, tem sido alvo constante das críticas de Lula. Desde o início do mandato, o presidente frequentemente atribui os problemas econômicos do Brasil à política de juros adotada pelo Copom, rotulando-a como prejudicial ao crescimento do país. Contudo, agora que seus próprios indicados votaram a favor do aumento da Selic, surge a pergunta: quem Lula irá culpar desta vez?

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Lula sempre foi rápido em demonizar aqueles que votavam para manter os juros altos. Afirmou diversas vezes que Roberto Campos Neto “tem lado político” e trabalhava “para prejudicar o país”. O que dirá agora o presidente a respeito daqueles que ele mesmo indicou? Será que, após o voto de Galípolo a favor da alta dos juros, Lula vai rever sua nomeação? É claro que não. O silêncio de Lula após essa última decisão revela que a metralhadora giratória do presidente o colocou em uma encruzilhada.

Culpabilizar Campos Neto pelas mazelas da economia brasileira, uma vez que foi indicado no governo Bolsonaro, era fácil. Agora, apontar o dedo para seus próprios nomeados se tornou mais complicado, especialmente quando Galípolo ainda não passou pela sabatina no Senado. Lula está calado pois sabe que argumentos adotados até aqui são frágeis e seguir os utilizando enfraqueceria as próprias indicações do governo.

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Se Lula estivesse realmente interessado em entender os motivos por trás da alta dos juros, bastaria analisar a ata do Copom, divulgada na última terça. O documento explica claramente que um dos principais motivos para o aumento dos juros são os riscos fiscais internos do país e a necessidade de “uma política fiscal crível, embasada em regras previsíveis e transparência em seus resultados”, coisa que a atual política do governo não é.

Uma política fiscal que acredita que um país com tamanha carga tributária conseguirá atingir o equilíbrio fiscal somente com aumento de impostos, simplesmente não é crível. Para que seja, o governo Lula precisa demonstrar comprometimento com corte de gastos, e iniciar uma agenda de reformas que leve à redução do custo da máquina pública, algo que sequer esboçou até agora.

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Para ser previsível, o governo precisa também traçar e divulgar um plano claro de como pretende equilibrar as contas e iniciar um processo de queda na dívida pública, medida também ignorada até aqui. As metas estabelecidas pelo próprio governo no arcabouço fiscal estão cada vez mais em descrédito e o governo continua querendo tirar coelhos da cartola ao invés de desenhar e divulgar um plano factível que envolva controle dos gastos públicos, reformas estruturais e cumprimento das metas fiscais.

Metas essas, por sinal, que para gerar credibilidade dependem da transparência do governo em relação às suas contas e clareza de como irá cumpri-las, pontos que também não têm sido respeitados pelo governo, que tem buscado artifícios contábeis para atingi-las, ao invés de prezar pelas medidas adequadas.

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Durante seus mandatos anteriores, Lula tentou baixar os juros “na marra”, mas foi contido pela resistência de Henrique Meirelles, então presidente do BC, conforme revelado em seu novo livro. Resistência essa que não foi apresentada por Alexandre Tombini, que cedeu às pressões de Dilma Rousseff para reduzir a Selic a qualquer custo, e levou o Brasil à maior recessão de sua história.

Com o Banco Central agora independente, Lula não pode mais baixar os juros no grito, felizmente, pois isso protege o país de uma política monetária desastrosa. Para que os juros caiam de forma sustentável, é necessário agir sobre os fundamentos que mantêm as taxas elevadas.

Resta saber se o presidente estará disposto a fazê-lo, cortando gastos, promovendo reformas e garantindo transparência às contas públicas. Infelizmente, tudo indica que não. Parece que o caminho mais fácil — o da culpabilização de terceiros — continua sendo o preferido. E nisso, Lula sempre foi mestre.

Economista André Perfeito fala sobre a decisão de Lula por Galípolo no Banco Central e o que esperar:

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