Pablo Marçal deixou claro desde o início que tem pouco apreço pela democracia, pelos partidos políticos, pelas instituições e pelas regras do jogo
Em 24/09/24 18:16
por Coluna do Prando
Rodrigo Augusto Prando é Mestre e Doutor em Sociologia, Professor universitário e pesquisador. Conselheiro do Instituto Não Aceito Corrupção, membro da Comissão Permanente de Estudos de Políticas e Mídias Sociais do Instituto dos Advogados de São Paulo e voluntário do Movimento Escoteiro.Textos essenciais de serem lidos para acompanhar e refletir sobre os movimentos da sociedade e do Poder.
Apresentador Carlos Tramontina adverte Pablo Marçal (PRTB) em debate do Flow News, na segunda-feira (23)
Cidadãos e eleitores foram, neste período eleitoral, expostos à disputa política nos mais de 5 mil municípios do Brasil. Elegeremos, em breve, vereadores e prefeitos, membros do Poder Legislativo e os chefes do Executivo, respectivamente. Na cidade de São Paulo, especialmente, pululam os adjetivos usados para definir os inúmeros debates entre os candidatos e poucos são positivos.
Já há, em curso, um debate que avalia se vale a pena manter debates no período eleitoral ou, ao menos, se esse modelo não se encontra esgotado, superado mesmo. Obviamente, São Paulo tem candidatos comprometidos com o debate político civilizado, com a democracia, com ideias, propostas e com respeito às regras e aos adversários.
No entanto, existe também, Pablo Marçal, que deixou claro desde o ínicio seu pouco apreço pela democracia, pelos partidos políticos, pelas instituições e pelas regras do jogo. Marçal, ressalte-se, é sintoma e não a causa de uma situação que, para muitos, avança na direção de uma anomia e de aprofundamento da crise das democracias liberais representativas.
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Questionamentos sobre o modelo dos debates são válidos. Classicamente, temos perguntas de candidato para candidato, direito a réplica e a tréplica; perguntas dos jornalistas; perguntas do público (telespectadores e internautas) e direito à resposta em caso de ofensa à honra. O fato é que não há modelo que sirva quando surgem figuras carismáticas, populistas, extremistas e avessas às regras. Simplesmente, não se enquadram e isso é parte de seu DNA político.
Não raro, o olhar do populismo extremista é de quem não entende o outro candidato como adversário e sim como inimigo. Mais do que isso, o mundo se divide em dois grandes grupos: os que estão comigo e são amigos (eu e o povo) e os inimigos (todos os demais candidatos, partidos, mídia, intelectuais, instituições, etc.).
A retórica do ódio nos debates, as ofensas, fake news, pós-verdades, distintos negacionismo e teorias da conspiração não são invenções recentes e tampouco de Marçal, pois atores políticos como Donald Trump, Nicolas Maduro, Jair Bolsonaro, entre tantos outros servem-se desse expediente corrosivo à democracia. Um outro aspecto: esses candidatos se colocam, quase sempre, na condição de vítimas, perseguidos pelos sistema, mas consideram-se ungidos e assumem postura messiânica.
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Some-se a esse quadro geral o fato de que vivemos numa sociedade hiperconectada em rede, cuja força das redes sociais e das big techs são evidentes. Temos, ademais, uma lógica inerente aos algoritmos que selecionam e impulsionam conteúdos que mobilizam os sentimentos: medo, raiva, ódio, angústia, frustação, alegria, excitação. Desta forma, na sociedade e nos debates políticos o conteúdo racional, ponderado, explanado com clareza, com propostas concretas e não milagrosas, perdem espaço.
Alguém, então, indaga: não se pode excluir figuras extremistas e corrosivas? A democracia não traz em seu bojo a diversidade? Mas, ao valorizar a diversidade e a pluralidade não estaria a democracia refém daqueles que usam a democracia, a liberdade de expressão e as instituições para justamente solapar essas conquistas civilizacionais? Aqui, o famoso paradoxo da tolerância. Não é simples resolver um problema assaz complexo.
Não bastassem a violência retórica e as fake news – que muitos entendem como mera liberdade de expressão – vivenciamos episódios de violência física. José Luiz Datena, no debate da TV Cultura, atingiu Marçal com uma cadeira; no debate promovido pelo Flow News, Marçal foi expulso por descumprimento das regras acordadas e um de seus assessores agrediu o marketeiro do prefeito Ricardo Nunes com um soco, o deixando ensanguentado. Isso tudo é a pura e evidente negação da política, que busca equacionar e resolver os conflitos por meio do diálogo, dentro das instituições e respeitando as leis.
À guisa de finalização, é importante enfatizar que este artigo não pode – e nem pretende – esgotar o tema em tela. Social e politicamente temos que, com tenacidade democrática, ética e respeito às leis, enfrentar essas e tantas outras questões. Os debates devem retornar à normalidade e a violência, toda ela, deve ser condenada e capturada pelas leis.
O tempo das redes sociais e da sociedade são sempre mais velozes que as instituições e suas legislações, por exemplo. Todavia, temos em nossa sociedade um manancial de inteligência, vontade, generosidade e desejo de ampliar a liberdade e a busca de melhor convivência social. A realidade reclama que nos posicionemos de forma clara: democracia, civilidade, respeito às regras e valorização da política, isolando a violência e o extremismo, sempre!
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