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BALAIO DO KOTSCHO

Lula faz discurso de estadista, é aplaudido 7 vezes e lava a alma do Brasil na tribuna da ONU

Foi mesmo de lavar a alma dos brasileiros, depois dos vexames dos anos bolsonaristas na ONU

Em 19/09/23 15:25
por Balaio do Kotscho

Ricardo Kotscho, 75, paulistano e são-paulino, é jornalista desde 1964, tem duas filhas, 5 netos e 19 livros publicados. Já trabalhou em praticamente todos os principais veículos de mídia impressa e eletrônica. Foi Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República (2003-2004). Entre outras premiações, foi um dos cinco jornalistas brasileiros contemplados com o Troféu Especial de Direitos Humanos da ONU, em 2008, ano em que começou a publicar o blog Balaio do Kotscho, onde escreve sobre a cena política, esportes, cultura e histórias do cotidiano

As coisas precisam ser ditas como as coisas são, sem medo de errar nem de incomodar ninguém.

Que me perdoem os coleguinhas da imprensa isenta, mas deu orgulho de ver Lula hoje na tribuna da ONU, tecendo um discurso histórico, ao denunciar asdesigualdades, de todos os gêneros, em todas as latitudes, ainda o grande mal da humanidade neste início de século 21.

Foi mesmo de lavar a alma dos brasileiros, depois dos vexames dos anos bolsonaristas na ONU. Quem ouviu os discursos de Bolsonaro, em 2022, e o de Lula, nesta terça-feira, 19 de setembro de 2023, nem pode acreditar que os dois são originários do mesmo país.

Lula fez um discurso de estadista, com começo, meio e fim, falando para o mundo, enquanto o outro se dirigia apenas aos seus devotos no Brasil, em permanente campanha eleitoral, espancando os fatos e a realidade factual, sem conseguir falar mais do que 7 minutos para uma plateia esvaziada que não prestava a menor atenção.

Para quem acha exagero, pergunto quem são os outros estadistas respeitados fora de seus países no mundo de hoje, além do papa Francisco?

Lula falou em nome do Sul Global, uma nova força geopolítica formada por países da América do Sul, da África e da Ásia que procuram se unir exatamente para enfrentar as desigualdades provocadas nas relações desiguais de comércio até hoje existentes pelo domínio do velho Norte Global.  

Mais do que as 7 vezes em que Lula foi aplaudido em cena aberta, ao longo dos 21 minutos de discurso na abertura da assembleia-geral, em que não falou uma palavra a mais, nem a menos, impressionou-me o silêncio da plateia, acompanhando atentamente sua fala com fones no ouvido e acenos de concordância com a cabeça.  

Em seguida, foi a vez de Joe Biden falar, e surpreender os jornalistas brasileiros, que esperavam um duro embate entre os dois, com visões de mundo tão diferentes.

Ao contrário, como se tivesse lido o discurso de Lula antes de escrever o dele, Biden concordou com quase tudo o que Lula falou, a começar pela cobrança de mais ajuda dos países ricos e dos organismos multilaterais para o Terceiro Mundo. Os dois têm um encontro marcado hoje em Nova York para discutir um plano de combate ao trabalho precarizado, uma das pontas soltas da desigualdade econômica e social entre os países e dentro de cada um deles.

Transcrevo abaixo alguns trechos do discurso de Lula que foram mais aplaudidos.

“O neoliberalismo agravou a desigualdade econômica e política que hoje assola as democracias. Seu legado é uma massa de deserdados e excluídos. Em meio aos seus escombros, surgem aventureiros de extrema direita, que negam a política e vendem soluções tãofáceis quanto equivocadas. Muitos sucumbiram à tentação de substituir o neoliberalismo por um nacionalismo primitivo, conservador e autoritário”.

Em tempo: o nome do ex-presidente Jair Bolsonaro não foi citado nenhuma vez.

“ Para vencer a desigualdade, falta vontade política daqueles que governam o mundo. Se hoje eu retorno à honrosa condição de presidente do Brasil, é graças à vitória da democracia em meu país. Somente movidos pela força da indignação poderemos agir com vontade e determinação para vencer a desigualdade e transformar efetivamente o mundo ao nosso redor.
“Não haverá sustentabilidade sem paz. Conhecemos os horrores e os sofrimentos produzidos por todas as guerras. É perturbador ver que persistem antigas disputas não resolvidas e que surgem ou ganham vigor novas ameaças. Bem o demonstra a dificuldade para garantir a criação de um Estado para o povo palestino.

Em tempo: Sobre a guerra entre Rússia e Ucrânia, sua pauta mais delicada no cenário internacional, Lula disse que o Brasil tem pregado a paz e criticou os países da Otan (Organização dos Países do Atlântico Norte) por continuaram fornecendo armas para o país invadido. Hoje, Lula tem encontro finalmente marcado com Volodomyr Zelenski e também deverá tratar da guerra com Joe Biden. Agenda de estadista, como se vê (Lula também tem reuniões bilaterais marcadas com Alemanha, Noruega, para tratar do Fundo Amazônia, e uma dezena de outros países).

“A fome, tema central da minha fala neste Parlamento mundial 20 anos atrás, atinge hoje 735 milhões de seres humanos, que vão cormir esta noite sem saber se terão o que comer amanhã. O mundo está cada vez mais desigual. Os dez maiores bilionários possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade. “

Desde o seu primeiro discurso, como candidato a presidente, em 1989, Lula nunca deixou de tratar a questão da fome como uma prioridade dos seus programas de governo. “Três refeições por dia para todos”, era o lema dele _ e continua sendo. Faz isso, não porque ouviu falar que se trata de um grave problema no Brasil e no mundo, ou leu a vasta bibliografia existente sobre o assunto, mas porque viveu na pele o que é ir dormir sem saber se terá comida amanhã.

Valeu, presidente Lula.

Vida que segue.

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