Para a reforma da Carta Magna, três áreas chaves devem balizar os trabalhos
por Regiane Bressan em 24/05/21 12:52
Derivada do antigo regime militar de Augusto Pinochet, a Constituição Política da República do Chile foi sendo fortemente criticada ao longo de anos. As manifestações chilenas de 2019, evocaram a revogação da Constituição Chilena, inclusive porque ela consolida um papel mínimo do Estado na prestação de serviços básicos.
A Convenção da Constituinte tornou-se realidade com as eleições para compor este Colegiado no mês de maio de 2021. O resultado foi surpreendente pois quase um terço dos assentos foi composto pela ala dos “independentes”, pois os partidos tradicionais foram preteridos. Tratando da ala centro-esquerda, a qual governou o país por vinte anos, entre 1990 e 2010, esta foi superada pelo Partido Comunista e pela Frente Ampla.
Como primeira tarefa, os 155 membros da Convenção elegerão um presidente e um vice-presidente. Em seguida, terão que definir as regras de trabalho, como inclusão de participação cidadã. Na sequência, a Convenção terá de nove meses a um ano, para apresentar um novo estatuto fundamental, sendo referendado em um plebiscito popular em meados de 2022.
A nova Constituição deverá respeitar o caráter da República do Estado do Chile, seu regime democrático, as decisões judiciais definitivas e executórias, bem como os tratados internacionais ratificados pelo país em vigor. Para a reforma da Carta Magna, três áreas chaves devem balizar os trabalhos.
Atualmente, o papel do Estado na Constituição Chilena é subsidiário. A reforma política deve incorporar um Estado social de direito. A necessidade de um Estado mais presente nas demandas sociais foi reivindicada nos protestos massivos de 2019, quando se clamou por maior proteção em áreas como saúde ou educação. Neste sentido, haverá discussão muito forte sobre os direitos sociais e econômicos, bem como no papel do Estado na provisão dos serviços públicos em geral. Existe um amplo consenso em incorporar o papel do Estado de forma mais detalhada, como educação, saúde, segurança social, moradia, entre outros; além dos direitos de segunda geração, como a não discriminação e a participação.
O debate sobre o regime político e a distribuição do poder tornou-se bastante relevante para a nova Carta Magna. Questionam-se o modelo presidencialista chileno por parte daqueles que consideram o presidente com muitos poderes. Uma das principais causas da crise chilena foi a rigidez institucional que criou um regime de “hiperpresidencialismo”. O modelo chileno é bicameral, mas as câmaras não parecem exercer o seu peso real e os partidos políticos denotam fragilidade deliberativa.
Na nova Constituição, torna-se fundamental instituir o equilíbrio de poder entre o presidente e o Congresso, ampliando a participação política e colocando em prática mecanismos democráticos, como o controle social, entre os períodos de eleições. A definição de distribuição do poder do executivo afetará diretamente a conformação de novas leis na Constituição. Algumas alternativas começaram a surgir, incluindo o semi-presidencialismo ou o parlamentarismo.
A definição de direitos para as comunidades indígenas e o debate sobre um Estado plurinacional constituem outro tema fundamental à nova Constituição. A recém-eleita Convenção Constitucional incorpora 17 representantes indígenas pertencentes aos 10 povos originários do Chile reconhecidos pelo Estado, entre eles os Mapuches, Aymara, Quechuas e Diaguitas.
Entre as demandas dessas comunidades está a criação de um Estado plurinacional, com o qual sua autonomia e direitos sejam aceitos. Além disso, levantam a necessidade de garantias territoriais e de reconhecimento de sua cultura e língua.
O reconhecimento constitucional dos povos indígenas e a inclusão de direitos garantidos e reconhecidos na Constituição, além de deterem forte efeito simbólico, garantirão a incorporação como direito positivado.
Outras temáticas, como o meio ambiente e direito à água, devem ser discutidas vigorosamente pela nova Constituinte. O perfil político-ideológico dos membros eleitos para este pleito e as reivindicações populares confirmam que os chilenos querem mudanças profundas no país.
Regiane Bressan é professora da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e especialista em Política Internacional e Relações Internacionais.
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