Perícia deverá avaliar se existe o nexo de causalidade entre o contágio e o exercício da atividade laboral
por Sara Quental em 02/01/21 10:35
O afastamento do trabalho do empregado contaminado pelo vírus SARS-CoV-2, causador da Covid-19, poderá ser reconhecido como doença ocupacional a depender das características do caso concreto e da análise da perícia médica federal, que deverá avaliar se existe o nexo de causalidade entre o contágio e o exercício da atividade laboral.
O Ministério da Economia, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho e a Secretaria da Previdência Social, divulgaram a Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME, que aborda a Covid-19 e o nexo de causalidade com a atividade profissional, a depender do contexto fático, e de acordo com as regras previstas da legislação previdenciária.
Vale lembrar que a questão da Covid-19 ser considerada doença ocupacional constou da Medida Provisória 927/2020, onde o artigo 29 previa que os casos de contaminação não eram considerados doenças ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo casual. Tal dispositivo teve a aplicação suspensa, em caráter liminar, por decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 6344, 6346, 6348, 6349, 6352, 6354. Porém, como a MP 927 não foi convertida em lei e o julgamento das ADIs perderam o objeto, o tema foi reanalisado pelos órgãos técnicos e jurídicos e novas orientações foram dispostas na Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME.
A Covid-19, em razão de ser uma patologia recente, não consta no anexo II do Decreto 3.048/1999 como doença ocupacional, mas, de acordo com a análise da referida Nota, a doença poderá ser enquadrada como acidente do trabalho por doença equiparada, de acordo com o parágrafo segundo do artigo 20 da Lei nº. 8.213/1991. Isto é, em casos excepcionais, o nexo de causalidade será estabelecido se demonstrada que a Covid-19 foi adquirida ou desencadeada em função das condições especiais em que o trabalho é realizado, e que com ele se relaciona diretamente.
Importante pontuar, ainda, que embora a Lei nº. 8.213/1991, disponha que a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, não é considerada acidente do trabalho, a parte final do artigo 20, §1º, “a”, prevê a possibilidade do enquadramento, desde que comprovado que contágio é resultante de exposição ou contato direto em razão do exercício da atividade, hipótese cabível para o período de pandemia.
Após o requerimento ao INSS do benefício de auxílio por incapacidade temporária, a análise do contexto fático será realizada pela perícia médica federal, que avaliará se o adoecimento e o contágio do trabalhador têm relação com a sua ocupação ou com as condições especiais em que o seu trabalho é executado, não sendo considerada em favor do empregado a presunção legal de que a contaminação é doença ocupacional.
Portanto, a perícia médica avaliará se a contaminação ocorreu no exercício de atividade desenvolvida, por sua natureza, com exposição habitual e permanente ao risco de infecção pelo coronavírus, hipótese em que será considerada como doença ocupacional, ou se a doença foi ocasionada pela contaminação acidental do empregado pelo vírus SARS-CoV-2, durante o exercício de sua atividade, sendo neste caso considerado acidente de trabalho por doença equiparada.
O reconhecimento da Covid-19 como doença profissional ou acidente do trabalho resultará na concessão pelo INSS do benefício de auxílio por incapacidade temporária acidentário (espécie B91). Além do direito à estabilidade provisória de 12 meses no emprego, após a alta do INSS e retorno à atividade, caso haja o agravamento do quadro clínico e a caracterização da incapacidade total e permanente, esse auxílio por incapacidade temporária poderá ser convertido em aposentadoria por incapacidade permanente acidentária, com benefício calculado com coeficiente de 100% do salário de benefício.
No entanto, caso o benefício concedido em razão do afastamento, seja o auxílio por incapacidade temporária previdenciário (espécie B31), se necessária a conversão para aposentadoria por incapacidade permanente previdenciária, o cálculo da aposentadoria, após a Reforma da Previdência, foi alterado e será de 60% do salário de benefício, acrescido de 2% a cada ano de contribuição acima dos 20 anos de trabalho para o homem e 15 anos para a mulher.
Importante pontuar que em caso de indeferimento do benefício pelo INSS, o segurado tem o prazo de trinta dias para apresentar recurso à Junta de Recursos da Previdência Social ou ainda, caso o INSS reconheça a Covid-10 como doença ocupacional ou acidente do trabalho e a empresa apresente defesa para desconstituir o nexo técnico epidemiológico, o INSS informará ao segurado sobre a contestação da empresa para que este possa impugná-la e apresentar suas provas.
Sara Quental é advogada especialista em Direito Previdenciário e sócia da Crivelli Advogados
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