Em janeiro, desvalorização de imóveis comerciais se estabilizou. Tendência é que empresas comecem a retomar atividades presenciais em escritórios mais adaptados ao home office
por Letícia Macedo em 01/03/21 11:59
O mercado de imóveis comerciais começou 2021 em um compasso de espera e ainda muito pressionado pela alta no número de devoluções impulsionadas pela pandemia de covid-19. Especialistas começam a observar sinais de retomada nas atividades presenciais em escritórios mais adaptados ao trabalho remoto.
Para Yara Matsuyama, gerente de locações de escritórios da consultoria internacional JLL, haverá um “resquício de devoluções” nesse início de ano, o que já foi notificado no fim de 2020. “Porém, espera-se que haja uma redução desse fluxo de devoluções em 2021. Quem não devolveu ainda, tende a esperar um pouquinho para ver como vai evoluir a retomada das atividades presenciais.”
Yara espera uma certa melhora no mercado de imóveis comerciais a partir do segundo trimestre. “Não se tem a ilusão de que 2021 será como 2019, mas, com certeza, vai ser melhor do que 2020”.
“O ano passado foi de muitas incertezas, porque vivemos uma situação sem precedentes. Agora, conhece-se os protocolos de prevenção e a tendência é que tenhamos mais controle da pandemia graças à vacina. As pessoas querem voltar à rotina. O comércio está voltando a responder e no ambiente corporativo é a mesma coisa”, observa Yara.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) acompanhou a expansão do trabalho remoto em 2020, enquanto o número de casos de infecções pelo novo coronavírus explodiu em todo o país e uma vacina ainda parecia um sonho distante. Em maio, mais de 8,7 milhões de funcionários exerciam suas atividades remotamente, mas esse número foi caindo aos poucos até chegar a cerca de 7,3 milhões em novembro.
Com a redução drástica da atividade presencial e a crise econômica, muitas empresas começaram a devolver parte de seus escritórios vazios: a taxa de disponibilidade dos imóveis comerciais passou de 13,6% no primeiro trimestre para 20,2% no quarto trimestre, segundo a consultoria JLL.
Um levantamento do FipeZap feito em dez cidades brasileiras apontou que o valor médio de venda dos imóveis comerciais acumulou recuo de 1,21%, enquanto o preço médio de locação caiu 1,07%. A desvalorização foi na contramão da inflação do período, tanto no caso do IPCA/IBGE (+4,52%) quanto do IGP-M/FGV (+23,14%).
O impacto no preço médio dos imóveis, no entanto, não foi homogêneo quando se observa diferentes capitais. Imóveis de Brasília (-6,6%), Belo Horizonte (-3,74%) e Rio de Janeiro (-3,56%) sofreram mais do que os da cidade de São Paulo, que manteve uma variação positiva de 0,52%.
Em janeiro deste ano, os valores de venda e locação de imóveis permaneceram estáveis. “Para o mercado comercial, 2020 foi muito cruel, mas a expectativa é de que os preços voltem a subir. Talvez não subam para os patamares de antes da pandemia, porque a demanda pode não voltar a ser tão forte já que as empresas não devem voltar 100% para os escritórios”, afirmou Sergio Castelani, economista do DataZAP.
Para Castelani, é difícil ser “muito otimista” nesse momento. “Até recuperar um ano de perdas demora. Porém, diferentemente de alguns meses atrás, a gente vê luz no fim do túnel, existe vacina, a possibilidade de imunização de rebanho. Isso é o que vai fazer as empresas voltarem para os escritórios de alguma maneira, e a expectativa é de que não demore tanto assim.”
Apesar da taxa de vacância de imóveis comerciais em São Paulo ter ficado acima de 15% (percentual considerado “saudável” para a regulação do mercado), Yara considera que o impacto da pandemia em 2020 ainda foi menor do que o esperado.
O ano terminou com 25 mil metros quadrados de imóveis comerciais devolvidos a mais do que os que foram alugados (incluindo o estoque de novos imóveis), o que é chamado de absorção líquida negativa.
“O mercado enxugou, reduziu. Quem ocupava 4 mil metros quadrados passou a ocupar 3 mil. Quem tinha dois escritórios, devolveu um. Ao longo de 2020, chegou-se a cogitar se o escritório iria acabar e todo mundo iria ficar em home office. No fechamento de 2020, foram 25 mil metros quadrados de absorção líquida negativa, o que não é nem um edifício inteiro. Não foi tão drástico quanto se pensou que seria”, explica.
A vacância de imóveis comerciais na capital paulista também variou de acordo com a região da cidade. A Faria Lima, que concentra prédios de alto padrão com empresas de tecnologia, bancos e escritórios de advocacia, sofreu menos o impacto das devoluções do que o eixo Berrini/Chucri Zaidan, que conta com escritórios de empresas de vários setores.
A região da Faria Lima começou 2020 com 7% de vacância e terminou com 10%, mesmo com as devoluções e com a entrega de uma torre comercial de alto padrão. No mesmo período, a vacância na Berrini/Chucri Zaidan passou de 13% para quase 30%, segundo o levantamento da JLL.
“A Berrini vinha em uma regularidade de muita oferta de imóveis comerciais desde 2015. Com pandemia, sofreu com mais devoluções. Já a Faria Lima demorou mais para refletir essas devoluções e encerramos o ano com absorção líquida positiva (de 35 mil metros quadrados)”, observa Yara.
Por sua vez, a vacância na região da Paulista, que tem um estoque de imóveis mais limitado, variou de 7,5% para 13%, o que considerado estabilidade. “A Paulista manteve-se na neutralidade, com pouca variação de valor, sem muita variação de vacância. O público da Paulista é fiel à Paulista”, ressaltou a gerente de locações da JLL.
A crise provocada pela pandemia veio acelerar um processo de busca por eficiência das operações que as empresas já vinham estudando. “A redução de custos é uma demanda há muito tempo, a pandemia foi só uma justificativa”, afirma o professor Paulo Porto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Uma das estratégias encontradas por algumas empresas foi abrir mão de grandes lajes corporativas em regiões caras, aproveitando a necessidade do trabalho remoto imposto pela crise sanitária.
Sergio Castelani afirma que a discussão sobre a volta aos escritórios, no entanto, gira em torno de quais são os ganhos e as perdas de produtividade no home office. “No começo, as pessoas ficaram com a sensação de ganho de produtividade – e esse ganho realmente existiu. Mas elas estavam trabalhando em projetos já começados, que já tinham passado daquela fase inicial em que há uma tendência maior a se fazer reuniões”, observa.
A tendência apontada por especialistas é a de implantação de escritórios híbridos, em que funcionários terão possibilidade de combinar trabalho remoto com alguns dias de atividade presencial e, para isso, espaço físico dos escritórios também está sendo repensado.
“Quem não fazia home office vai fazer, quem já fazia vai fazer mais, mas isso não significa que o escritório vai deixar de existir. Ele continuará a ter a função de promover a interação do grupo, de ser um espaço para difundir a cultura organizacional”, acredita Yara.
Para Porto, “é uma ilusão” acreditar que todo mundo vai trabalhar em casa depois da pandemia, porém ainda é cedo para avaliar qual será o impacto da vacância dos imóveis comerciais no longo prazo.
“Podemos dizer que as empresas vão devolver escritórios de 1000 m2 para ter apenas 500 m2? Não necessariamente, porque muitas lajes corporativas de médio e grande porte precisarão passar por uma readequação para promover mais espaçamento entre os funcionários”, afirma.
Como os alugueis de imóveis corporativos costumam ter contratos de 5 anos, cancelar o contrato gera multa para as empresas e, por isso, valeria a pena fazer essa readequação.
O professor também não descarta que empresas deixaram alguns imóveis em 2020 para aproveitar a vacância de imóveis e conseguir contratos financeiramente mais atraentes. “Imagina uma empresa que já está no 4º ano de contrato. Ela fez o cálculo e viu que valia a pena devolver esse imóvel agora e alugar um outro espaço.”
Essa nova realidade pode abrir espaço para novas tendências como a fuga de uma região tradicionalmente mais cara, como a Faria Lima.
“Pode acontecer um movimento da descentralização, por que o empresário vai continuar pagando um aluguel caro na Faria Lima, por exemplo, se ele pode encontrar escritórios mobiliados na região da Berrini?”, indaga Yara.
Por outro lado, a disponibilidade de imóveis nas regiões tradicionais e a possibilidade de escritórios mais enxutos abrem espaço para empresas de pequeno porte migraram.
“Uma empresa que está em região secundária e tem desejo de ir para região nobre pode encontrar uma grande oferta de imóveis. Tratam-se de espaços muito bons que passaram por reformas recentemente e que estão mobiliados. A crise abre espaço para negociação entre inquilinos e proprietários. A empresa que está chegando tem custo de mudança menor, porque já encontra o espaço pronto. Isso é muito decorrente da maturidade do mercado”, conclui a gerente da JLL.
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