Ministro e atual presidente do STF defende equilíbrio entre essencialidade e viabilidade ao interpretar direitos socioeconomicoculturais
por Luiz Fux em 07/12/20 00:39
Desde a Antiguidade Clássica, somos instigados a pensar o problema da desigualdade social. Aristóteles, em “Ética a Nicômaco”, já enunciava o conceito de igualdade distributiva, segundo o qual se deve tratar com desigualdade os desiguais. Com a licença para avançar na História das Ideias, volve-se o olhar ao Iluminismo, que impulsionou os valores da igualdade e da liberdade, ainda que apenas sob o aspecto formal. Mais à frente, a positivação dos direitos sociais nas Constituições e a sua vindicabilidade representaram o ponto de inflexão para que a desigualdade passasse a ser levada a sério pelo Direito. Por essa razão, seja na doutrina, seja na construção da pauta e na emanação de decisões pelo Poder Judiciário, a desigualdade se manifesta como um problema de alocação de recursos limitados.
Diuturnamente, juízes são confrontados com pedidos de tutela cuja concretização leva a mudanças no acesso a bens e a direitos. Ainda, é preciso colocar em perspectiva a legitimidade judicial para combater a desigualdade: não cabe aos magistrados a formulação das políticas públicas nem a designação das medidas que solucionarão esse problema estrutural. Cabe ao Judiciário, efetivamente, reagir às demandas dos cidadãos, quando as iniquidades ferem sua situação subjetiva.
Ante a essa característica, o papel do Judiciário é, na mais otimista das previsões, o de concretizar direitos sem perder de vista a necessidade de mitigação das desigualdades sociais. Em Estados Democráticos, comprometidos com a pluralidade, lidar com a desigualdade potencializa o brocardo “tratar desigualmente os desiguais”. Isso porque sua mitigação envolve escolhas sobre quais direitos concretizar, quando e em que grau. A formulação de qualquer argumento sobre a posição do Judiciário no tema parte da seguinte premissa: não há fórmula pronta para o combate às desigualdades, pelas múltiplas formas como essa se manifesta.
Para realizar essa tarefa, faz-se necessária a atuação de um Judiciário que interprete os direitos socioeconomicoculturais não só pela sua essencialidade, mas também pela sua viabilidade, diante da finitude dos recursos. Esse equilíbrio é o nosso desafio. E existem boas razões para crermos que a jurisdição brasileira está trilhando o caminho correto nessa missão.
Cada vez mais, nossos Tribunais, impulsionados pela agenda do Supremo Tribunal Federal, assumem a função de articular o reconhecimento de direitos fundamentais que, por outra via, seriam objeto de impasse. Para o futuro, projeta-se que essa interação complementar e harmônica entre os Poderes se mantenha e se aprimore, em prol da expansão qualitativa e quantitativa da cidadania, com uma distribuição mais equânime de oportunidades e bens.
Luiz Fux é ministro do Supremo Tribunal Federal e atualmente é o presidente da Corte
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