Após pautar a votação da PEC do Voto Impresso para esta terça-feira (11) no plenário da Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) agora fala em adiar a votação, devido à exibição de blindados das Forças Armadas na Esplanada dos Ministérios. Segundo Lira, o desfile de blindados é “uma trágica coincidência”. O exercício militar que normalmente acontece na cidade de Formosa (GO), este ano vai entrar em Brasília (DF) e desfilar pela Esplanada dos Ministérios, parando em frente ao Palácio do Planalto. A iniciativa está sendo vista como uma forma de intimidação ao Congresso Nacional, justamente no dia em que está prevista a votação da PEC do Voto Impresso, já que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a dizer que não haverá eleições em 2022, caso o voto impresso seja rejeitado pelos deputados.
Na avaliação do jornalista Reinaldo Azevedo, o desfile de tanques blindados em Brasília é uma ação autoritária, com a intenção de alimentar o medo da sociedade de que haja um golpe militar, assim como em 1964. “Não é um ensaio geral do golpe, mas é uma expressão de truculência do Braga Netto e do Bolsonaro. O poder político tem que dar uma resposta. (…) É preciso que o Congresso dê uma resposta maiúscula a isso. Se até ontem alguns queriam o voto impresso, e querer o voto impresso em si não é absurdo. O absurdo é dizer ‘ou é voto impresso, ou é golpe’. Agora se criou uma coreografia que é a seguinte: aceitar o voto impresso nessas condições é ceder à pressão. Se até ontem era uma questão de opinião, agora é uma questão de ser canalha, vagabundo e golpista, ou não ser”, pontuou Azevedo, sobre a votação nominal do tema pelos 513 deputados em plenário, durante participação no programa ‘Segunda Chamada‘.
A jornalista Juliana Braga disse que tem conversado com generais da reserva que acreditam que, na tentativa de demonstrar força, na verdade Bolsonaro passa uma imagem de fragilidade e desespero com tais atitudes. Braga, entretanto, avalia que a temperatura da disputa de narrativas permanece alta e, para além das questões que opõem direita e esquerda no Brasil, há uma ala de militares nas Forças Armadas que teme a reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por medo de que seja revista a Lei da Anistia – que anistiou os crimes cometidos durante o período da Ditadura Militar.
Lilian Tahan, diretora de redação do portal Metrópoles, pontuou que em política não existe coincidência e todas as ações pretendem um efeito. “Mas é preciso dizer que a PEC não vai passar no Congresso. O que vai acontecer é um referendo do que foi discutido e brecado numa comissão especial e isso vai ser uma derrota importante para o governo. Bolsonaro quer mostrar que tem o poder de ataque e também que tem como se proteger. Nesse meio simbólico, ele confunde a população. Tem muita gente que tem a memória da ditadura, mas tem muita gente que não sabe o que aconteceu. As Forças Armadas se curvarão a Bolsonaro? Isso não é verdade, as Forças Armadas não se curvarão a Bolsonaro”, analisou a jornalista. Ela também lembrou que muitos militares estão alinhados a Bolsonaro por “necessidade”, já que atualmente existem mais de 6 mil cargos comissionados em vários níveis do governo federal ocupados por militares – sendo este apoio circunstancial.
Já para o pastor Ed René Kivitz, as atitudes de Bolsonaro de ameaçar o sistema democrático e as instituições são decorrentes de uma falta de entendimento do povo brasileiro sobre o que são a democracia e o estado democrático de direito. Kivitz também analisou a postura de Jair Bolsonaro na cadeira de presidente da República.
“A gente poderia estar discutindo a figura do presidente Bolsonaro como um político despreparado para a função, para a cadeira do Executivo. Hoje se discute se ele é um paciente psiquiátrico, um psicótico, um sociopata. Os psicanalistas estão discutindo o presidente da República pra saber se ele é minimamente equilibrado. Chegamos ao ponto de discutir os ataques à democracia, mas nós passamos disso, fomos aos marcos civilizatórios mínimos. Penso que atravessamos uma fronteira que não poderia ser atravessada. (…) O nosso presidente ultrapassou os preceitos mínimos. Não é mais política, democracia, civilização, são marcos civilizatórios mínimos de uma sociedade onde se preserva a justiça, a paz, o equilíbrio social e o respeito à dignidade humana”, avaliou.
A PEC do Voto Impresso foi rejeitada na comissão especial por 23 votos contrários e 11 a favor e com esse resultado não precisaria mais seguir para análise e votação no plenário da Câmara. Arthur Lira, entretanto, afirmou que levaria a pauta para votação para ser analisada pelos 513 deputados federais, dizendo considerar que são poucas as chances de ser aprovada.
O voto impresso tem sido assunto recorrente do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que chegou a ameaçar a não realização de eleições em 2022, se o sistema eleitoral for mantido com as urnas e a apuração eletrônicas no modelo atual. As acusações ao voto eletrônico por parte de Bolsonaro alcançaram o ápice no dia 29 de julho, quando o presidente fez uma live para as redes sociais e também transmitida pela TV Brasil, para acusar fraude no sistema de votação e mostrar vídeos de eleitores que supostamente indicariam a violação das urnas. Ao mesmo tempo em que manteve as acusações, Bolsonaro reconheceu que não tinha provas do que falava.
A live motivou a abertura de processo administrativo contra o presidente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a inclusão de Bolsonaro – também a pedido do TSE – no inquérito das fake news, pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Já nesta segunda (09), o TSE apresentou ao STF uma notícia-crime contra Jair Bolsonaro por vazamento de inquérito sigiloso da Polícia Federal. A notícia-crime é um pedido de investigação para apurar uma conduta que pode ter sido criminosa por parte do presidente.