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Para entender os conceitos

Pequeno Glossário Político: direita e esquerda

Este é o primeiro texto do que eu pretendo ser uma série de textos nos quais tentarei esclarecer termos que são muito usados e pouco compreendidos no debate político brasileiro.

por Aniello Olinto Guimarães Greco Junior em 12/07/22 09:17

Este é o primeiro texto do que eu pretendo ser uma série de textos nos quais tentarei esclarecer termos que são muito usados e pouco compreendidos no debate político brasileiro. E o começo óbvio é exatamente os termos que dividem famílias e terminam amizades. Todo mundo sabe dizer se é de direita ou de esquerda, mas poucos sabem explicar exatamente o que isto significa. Em especial é difícil definir o que seria o lado de lá, sem cair em acusações, exageros e rótulos odiosos. Vou tentar aqui propor uma definição dos termos sem cair em exageros. E com isto provavelmente atrair a fúria de direitistas e esquerdistas.

A primeira vez que se usou estes termos para se definir perfis políticos foi lá na Revolução Francesa. Após a promulgação da primeira Constituição Francesa, se criou a Assembléia Legislativa. Nela haviam três grupos políticos. O primeiro era os girondinos, que se sentavam a direita do Parlamento. Os girondinos defendiam o cumprimento da Constituição, mantendo-se a monarquia, o direito dos nobres e aristocratas. A esquerda do parlamento se sentavam os jacobinos e os cordeliers, que defendiam mudanças mais profundas, principalmente o fim da monarquia e a instalação da República. Cabe ainda lembrarmos dos sans-culottes, grupo mais popular que sequer conseguia participar do parlamento.

Mas graças a esta distribuição entre conservadores à direita e os que desejavam mais mudanças à esquerda que se criou a terminologia que usamos até hoje. Contudo o sentido de esquerda e direita vai se transformando ao longo do tempo.

Durante a Revolução Francesa o debate era a direita querendo preservar a aristocracia dos nobres como os governantes por direito de berço, e que o poder deles deveria ser justificado apenas por eles serem os aristocratas. Já a esquerda defendia que o poder dos governantes deveria ser limitado para garantir que os direitos humanos universais fossem respeitados. Era a revolucionária (literalmente) ideia de que um governante não pode exercer sua vontade irrestrita sobre o governado. Para tal era necessário limitar os poderes dos governantes e defender a liberdade, a igualdade e a fraternidade dos governados. O nome desta ideologia? Liberalismo.

Após a Revolução Francesa e Independência Americana se estabelecerem, e com a queda das monarquias absolutistas ao redor do mundo (queda feita não por ideias de liberdade, e sim por banhos de sangue e soldados bonapartistas), temos a primeira mudança significativa. O modelo político padrão no imaginário ocidental se tornou a democracia liberal.

Então o paradigma conservador deixou de ser a defesa de uma aristocracia de nobres e tornou-se a manutenção de um estado que proteja as liberdades individuais e se ausente de interferir na economia. Contudo isto acabou por se traduzir no controle econômico e político da sociedade por uma oligarquia de grandes industriais, e gerou uma enorme desigualdade econômica. Até mesmo na cidade mais rica do mundo, Londres, tínhamos milhões de trabalhadores em estado de penúria, trabalhando 12, 14, 16 horas por dia para não morrerem de fome.

Esta concentração de capital em poucos capitalistas acaba por criar uma nova esquerda. Anarquistas, socialistas, trabalhistas e sindicalistas que defendiam que mais importante que a liberdade defendida pelo liberalismo era a igualdade tão ignorada pelas democracias liberais do século XIX. O debate entre direita e esquerda passou a se focar entre o que era mais importante para uma sociedade justa: a liberdade econômica ou a igualdade entre os cidadãos. Curiosamente a fraternidade saiu do centro do debate.

Este novo debate político se radicaliza no início do século XX, após a Primeira  Guerra Mundial, a Revolução de 1917 e a Crise de 1929. Surgem correntes extremas. De um lado o fascismo que basicamente defende que os cidadãos que formam a essência da nação tem total liberdade para subjugar ou até exterminar os indesejados. É a defesa extrema da liberdade de matar quem é considerado inimigo da nação. De outro temos o marxismo-leninismo que se transforma em uma autorização do governo impor a força uma igualdade extrema, sacrificando a liberdade daqueles que se opusessem ao governo revolucionário.

Os liberais, acuados, acabam por fazer um apoio amedrontado ao fascismo por medo do inimigo maior do marxismo. Afinal os facistas ao menos mantinham o direito a propriedade privada e a acumulação de capital.

E aí temos a Segunda Guerra e seus horrores. O fascismo é aparentemente exterminado. Parte do liberalismo se reforma, aceitando a necessidade de políticas governamentais para minimizar as desigualdades, a famosa social-democracia, uma espécie de centro. A ideia de social-democracia, uma tentativa de manter a liberdade econômica capitalista com políticas governamentais sociais que tentassem minimizar as desigualdades, via previdência social e a criação de um Estado de bem Estar Social.

Mas a ameaça comunista ainda se fazia presente com a superpotência soviética. E o bloco capitalista acaba por aceitar o sacrifício de qualquer liberalismo democrático criando ditaduras capitalistas, com o discurso que isto salvaria a democracia dos perigo vermelho. Em nome da liberdade de ter propriedade privada se sacrificou a liberdade política.

Com a queda do bloco soviético, a ideologia marxista que havia se tornado sinônimo de socialismo passa a sofrer repúdio mundial. Ao mesmo tempo, as ditaduras de direita se suavizaram, e por grande parte do Ocidente as democracias liberais retornam, mas agora com um mínimo de preocupação social. Chegou-se a falar no fim das ideologias, no fim da história. No fim da polaridade entre esquerda e direita.

Contudo a desigualdade social continuou, em especial a desigualdade entre nações. E depois de umas duas décadas de aparente unanimidade de qual era o ideal político para o mundo, a saber, a criação de um mercado global interdependente e livre, os nacionalismos retornam. O fracasso desta nova ordem de trazer liberdade e igualdade leva ao ressurgimento de uma espécie de fascismo, onde os reais cidadãos de bem deveriam ter a liberdade de defender seu modo de vida sufocando aqueles que discordam.

É a nova polarização. Não é mais entre comunismo e capitalismo, apesar dos extremistas de direita assim discursarem. O que temos agora são 3 grandes grupos.

Uma extrema direita ultranacionalista que faz um discurso de que a liberdade é mais importante que os direitos humanos, a diversidade de opiniões, e até mesmo a existência de outras formas de viver sem ser os valores tradicionais. É o discurso de que limitar as ações para preservar o modo de vida do grupo supostamente majoritário em nome do direito das minorias seria limitar a liberdade. E que vale a pena morrer por isto.

No meio temos a antiga direita liberal, que acredita ainda em um globalismo democrático organizada principalmente pela liberdade econômica como meio de criar uma sociedade mais justa.

E do outro lado uma esquerda que tendia para a social-democracia, mas cada vez mais, por reflexo da radicalização promovida pela nova direita neo-fascista e pela demonização de qualquer defesa de ações governamentais pela igualdade, vai se radicalizando mas ainda sem um centro único de ação. A nova esquerda deve se manter focada nas relações trabalhistas ou nas causas identitárias? Ou ainda alertar dos riscos ambientais do sistema produtivo atual?

A ascensão da direita radical deixou a antiga direita e a combalida esquerda atarantadas. Mas ainda é fácil entender que o debate entre direita e esquerda é, como sempre foi, um debate sobre o que é mais importante: liberdade ou igualdade. E também é fácil ver que quando radicalizamos, sacrificamos uma em nome da outra e esquecemos da fraternidade.

Como no século XIX, hoje a maioria dos conservadores consideram que a liberdade, mesmo que a liberdade só de alguns no caso dos extremistas, é o maior bem a ser preservado. E que a igualdade é desejável, mas inatingível em sua plenitude. Os progressistas acreditam que não existe real liberdade quando há desigualdade de condições. E os revolucionários acreditam que só se chega a liberdade após eliminar as desigualdades, e que quase ninguém é realmente livre hoje.

*As opiniões das colunas são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a visão do Canal MyNews

*Aniello Olinto Guimarães Greco Junior é servidor público concursado do Tribunal Superior do Trabalho, Aniello Greco passou tempo demais na universidade, sem obter diploma. Já fingiu ser jogador de xadrez, de poker, crítico de cinema, sommelier de cerveja. Sabe de quase tudo um pouco, e quase tudo mal.

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