Ele aponta ainda para o risco de situação semelhante no Brasil em 2022
por Rodrigo Borges Delfim em 07/01/21 15:28
O que levou aos acontecimentos da última quarta-feira (6) no Congresso dos Estados Unidos, que acabou invadido por apoiadores de Donald Trump e que tentou – sem sucesso – impedir a ratificação da vitória de Joe Biden na eleição presidencial?
Para Felipe Loureiro, professor e coordenador do curso de Relações Internacionais da USP, essa situação se desenhava pelo menos desde o final de 2020, com a insistência do ainda presidente dos Estados Unidos em não reconhecer a derrota na eleição de novembro e de alimentar acusações sem provas contra o processo eleitoral.
“Era uma tragédia anunciada. Trump vinha no Twitter pelo menos desde o dia 19 de dezembro convocando as pessoas para uma manifestação no dia 6 de janeiro, usando palavras irresponsáveis. Ele chegou a dar a entender até que marcharia junto com os golpistas para o Capitólio”, resumiu o professor, em participação no Almoço do MyNews desta quinta-feira (7).
O episódio deixou claro ainda, segundo Loureiro, a força que alguns grupos extremistas de direita exercem no apoio a Trump e incentivados por ele, apoiados em teorias conspiratórias sem nenhum tipo de baseamento na realidade.
É até difícil a gente conseguir explicar como esse tipo de teoria da conspiração se desenvolve. Mas o importante é que ela se desenvolve e tem um grande número de adeptos. vivemos enormes transformações e nesses contextos algumas pessoas acabam recorrendo a explicações excessivamente simplistas para entender as enormes angústias que vivem”.
Um desses movimentos é o QAnon, grupo que crê em uma conspiração mundial de pedófilos satanistas e que vê em Trump um meio de resistência contra tal “dominação”.
Loureiro lembra que além dos adeptos do Qanon também existem integrantes de outros grupos de extrema-direita, como neonazistas e supremacistas brancos, que contam com a simpatia e apoio do republicano e possuem presença ativa em redes sociais. “Não dá pra dissociar as falas do presidente Trump dessas ações. Não somente falam, mas agora também estão agindo”.
Embora o grupo seja heterogêneo, um elemento comum à base de apoio de Trump é a percepção de que as eleições foram roubadas, um dos motes do discurso golpista do ainda presidente.
O comportamento do presidente antes, durante e depois da invasão ao Congresso levou alguns membros do gabinete federal e integrantes do Partido Republicano a discutirem a possibilidade de removê-lo da Casa Branca antes mesmo do final do mandato, em 20 de janeiro, com base na 25ª Emenda à Constituição.
Loureiro credita a essa situação o fato de Trump ter recuado horas após ter incitado a invasão ao Congresso e pedindo para os invasores irem para casa, ainda que de forma tímida e reafirmando – sem provas – que houve fraude na eleição
“Trump recuou porque ele percebeu claramente que a situação dele ficou muito complicada. Muito importante ressaltar a gravidade do que aconteceu. Nunca o Congresso americano foi invadido por cidadãos norte-americanos. A única vez que isso aconteceu foi na guerra contra a Inglaterra, em 1814.
O professor disse ainda que o Partido Republicano, que hoje abriga Trump, tem grande parcela de culpa pela atual situação, embora reconheça que alguns integrantes não se curvaram ao ainda presidente. E vê a necessidade de uma grande mudança interna dentro da agremiação.
“O trumpismo dominou o Partido Republicano e não vai ser fácil tirar essa mácula. O partido vai ter que passar quase que por uma refundação para superar o que aconteceu”.
Loureiro crê que há dois movimentos necessários para tentar normalizar a situação. Um deles, já realizado, foi a retomada da sessão no Congresso, horas depois, para ratificar Biden. O outro seria aplicar uma punição exemplar sobre Trump.
“Outro passo é deixar claro que é inadmissível que um presidente instigue seus próprios apoiadores a irem contra a democracia. Ao meu ver seria muito importante o Trump ser penalizado claramente pelo que ele fez”.
Loureiro aponta ainda que os elementos que permitiram os acontecimentos no Capitólio também estão presentes no Brasil. Ele chama a atenção para o fato de o ainda presidente americano servir como modelo para seu colega brasileiro, Jair Bolsonaro (sem partido).
“Os próximos dois anos serão cruciais para a sociedade brasileira se unir e impedir que o pior aconteça em 2022”, finaliza.
Acostumado a usar as contas nas redes sociais para se manifestar, Trump deve encontrar dificuldades nos próximos dias.
Os perfis do republicano no Facebook e no Instagram foram suspensos até pelo menos a posse de Biden. O anúncio veio de Mark Zuckerberg, presidente do Facebook, que também possui o Instagram sob seu guarda-chuva, em razão do ocorrido no Capitólio.
“Acreditamos que os riscos de permitir que o presidente [Trump] continue a usar nossos serviços durante este período são simplesmente grandes demais”, disse Zuckerberg em um comunicado publicado em sua plataforma.
A conta de Trump no Twitter permanece ativa, mas chegou a ser suspensa temporariamente. As postagens que mencionavam fraudes sem provas nas eleições e outras notícias falsas foram removidas.
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