Outras Vozes

ELEIÇÕES CHEGANDO

Pelo fim do voto útil: conheça o voto preferencial

Em vez de votar em seu candidato preferido, muitos optam por aquele que parece ter mais chances de vencer o candidato que se quer eliminar

por Tiago Mitraud em 02/10/24 16:52

Toda eleição é a mesma história. No afã de “não deixar Fulano chegar ao segundo turno”, “resolver no primeiro turno” ou “diminuir as chances do candidato que rejeitamos”, o eleitor brasileiro acaba se vendo pressionado a fazer o chamado voto útil. Em vez de votar em seu candidato preferido, muitos optam por aquele que parece ter mais chances de vencer o candidato que se quer eliminar.

Com a polarização e a rejeição a determinados candidatos em alta, é fácil explorar o medo do eleitor, e vemos diversas campanhas surgindo a favor do voto útil. Tal estratégia acaba beneficiando candidatos que não são a primeira opção de muitos eleitores, mas que supostamente seriam mais viáveis. No fim do dia, quem perde é a democracia e, claro, a própria população.

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E não adianta culparmos o eleitor. O voto útil, mesmo que movido muitas vezes pelo medo, também tem sua dose de racionalidade. Afinal, o sistema eleitoral brasileiro acaba empurrando o eleitor para essa lógica. Em cidades com menos de 200 mil eleitores e na eleição de senadores, quem recebe mais votos vence, independentemente dos demais candidatos. Já nas cidades maiores, além das eleições para governadores e presidente, os dois mais votados vão para o segundo turno, mesmo que a maioria dos eleitores preferisse um terceiro colocado, não fosse levada a votar em um dos dois primeiros por força das atuais regras.

Por mais que seja um defensor convicto de que o eleitor sempre deve votar em quem considera o melhor candidato, é inegável que o voto útil faz algum sentido dentro das regras atuais. O problema, portanto, não é o eleitor, mas sim o nosso sistema eleitoral, que induz a esse tipo de voto.

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Assim como nas discussões da Reforma Tributária buscou-se um sistema que fosse neutro, como chamamos as regras que não induzem que decisões de negócios sejam tomadas devido às regras de tributação, deveríamos buscar um sistema eleitoral que não permita que a vontade do eleitor seja substituída por estratégias que busquem “navegar” o sistema.

A boa notícia é que esse sistema já existe: é o voto preferencial, ou voto ranqueado. Países como Austrália e Irlanda já o utilizam, assim como alguns estados dos EUA, como Alasca e Maine, e até mesmo a cidade de Nova York.

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Nesse sistema, os eleitores não escolhem apenas um candidato; eles ranqueiam suas opções, da que consideram a melhor opção, à pior. Isso permite que votem primeiro em quem realmente preferem, sem precisar recorrer ao voto útil.

Na apuraçào, se um candidato recebe mais da metade das primeiras escolhas, ele vence. Se não, o candidato com menos votos é eliminado, e as segundas opções dos eleitores que votaram nele são contadas. O processo segue até que alguém tenha maioria.

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Além de acabar com o voto útil, o voto preferencial elimina o “voto desperdiçado”, quando seu candidato não vence a eleição, ou não passa para o segundo turno. Se sua primeira escolha for eliminada, sua próxima opção entra em jogo. O sistema também incentiva campanhas mais propositivas, já que atacar adversários pode fazer com que os eleitores deste o joguem para o fim de suas listas, e candidatos que compartilham ideais próximos acabam unidos no topo do ranking de seus eleitores.

Outra vantagem é o fim da necessidade de um segundo turno, o que barateia campanhas e simplifica o processo eleitoral. Por fim, candidatos eleitos nesse modelo tendem a ser mais aceitos pela população como um todo, governando para todos, e não apenas para o seu nicho.

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E para quem acha que essa ideia jamais será discutida no Brasil, saiba que o voto preferencial já foi discutido e votado durante a Reforma Política de 2021 na Câmara dos Deputados. Uma emenda que apresentei sobre o tema chegou a receber o voto de 36 deputados.

É claro que ainda há um longo caminho a ser percorrido, mas essa é uma discussão que precisa avançar, não só aqui, mas em todo o mundo. Nos EUA, a organização FairVote (Voto Justo) tem conquistado avanços importantes nessa pauta. Vale dar uma olhada em seu site, fairvote.org, para saber mais a respeito do tema.

Neste ano, mais uma vez enfrentaremos os problemas do nosso sistema atual. Em vez de insistirmos em apenas repetir as mesmas críticas a ele, é hora de buscarmos soluções. E a adoção do voto preferencial é, sem dúvidas, a melhor delas.

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