É necessário que as políticas públicas considerem a desigualdade de gêneros em relação aos impactos de choques negativos sobre a economia
por Diana Gonzaga em 13/03/21 10:34
Um comportamento frequentemente observado por pesquisadores que estudam o mercado de trabalho e as desigualdades de gênero é que as mulheres possuem menores taxas de participação na força de trabalho e isso é acentuado em períodos de crises econômicas.
No caso da pandemia, que envolve medidas de distanciamento social, paralisação temporária de atividades econômicas e fechamento de escolas e creches, as mulheres podem ser triplamente penalizadas já que, além das perdas usuais dos períodos de recessão, podem sofrer impactos adicionais. O primeiro deles está relacionado com as normas de divisão social do trabalho entre os gêneros, que ainda atribuem às mulheres grande parte da responsabilidade dos cuidados com os filhos e a casa (trabalho não remunerado), comprometendo o seu retorno ao mercado de trabalho (trabalho remunerado). O segundo impacto adicional está relacionado a segregação ocupacional entre os gêneros no mercado do trabalho, que explica porque muitas mulheres estão inseridas em ocupações e setores mais impactados pelos efeitos da pandemia (serviços e comércio).
Ao longo da pandemia, a taxa de desemprego feminina e a parcela fora da força de trabalho aumentou, enquanto a participação feminina na força apresentou queda. Os dados do 3º trimestre de 2020 da Pnad-Contínua mostram que menos da metade das mulheres em idade ativa estava participando do mercado de trabalho (46%), enquanto a maioria dos homens estava participando (66%). Na região Nordeste, mesmo antes da pandemia (1º trimestre) apenas 45% das mulheres estavam na força de trabalho. A taxa de desocupação feminina no 3º trimestre foi de 16,8% enquanto a masculina era de 12,8% e a parcela de mulheres entre os trabalhadores fora da força de trabalho era de 64,2%. Por outro lado, mesmo antes da pandemia, as mulheres recebiam, em média, cerca de 79% do rendimento dos homens.
Entre os fatores que podem explicar a maior parcela de mulheres fora da força de trabalho estão o fechamento de postos de trabalhos nos setores de comércio e serviços, que possuem forte participação feminina, o fechamento das escolas e creches, a redução na demanda por trabalho doméstico remunerado e a dificuldade de retomada efetiva das atividades entre as informais. Em geral, as mulheres negras e as menos escolarizadas sofrem mais por não conseguirem terceirizar o trabalho doméstico.
Portanto, é necessário que as políticas públicas considerem a desigualdade de gêneros em relação aos impactos de choques negativos sobre a economia. Para isso não é suficiente reconhecer a desigualdade na divisão das atividades domésticas não-remuneradas, mas conceber políticas que possam reduzir essas desigualdades, seja estimulando a oferta de empregos em tempo parcial, para aquelas que buscam maior flexibilidade, ou fornecendo vagas em creches e escolas em tempo integral, criando as condições de acesso das mulheres ao mercado de trabalho. Na pandemia,
deve haver um planejamento para a retomada de creches e escolas, ainda que parcialmente, quando for possível. Por último, para as informais e mais vulneráveis é preciso garantir proteção social e assegurar uma renda mínima, até que tenhamos as condições para a retomada efetiva das atividades.
Diana Gonzaga é doutora em economia pela Universidade de São Paulo (USP) e professora do Departamento de Economia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Desenvolve pesquisas em Economia nas áreas de Economia Regional e Urbana, Economia do Trabalho e Microeconometria.
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