"Tempo de cuidado redobrado com as palavras que usamos"
por Sonia Bittencourt* em 20/10/22 17:04
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
“Ai, palavras, ai, palavras,
Que estranha potência a vossa…” – Cecília Meireles
As palavras são, de fato, poderosas e, de tempos em tempos, algumas saltam dos dicionários para a boca do povo. É assim na época do Natal, no Carnaval, nas Copas do Mundo… cada tempo com seu léxico que vem e vai embora… para retornar em outro ciclo.
Agora, em tempo de 2º turno das eleições, polarização acirrada, os ânimos se exaltam. Tempo de cuidado redobrado com as palavras que usamos. Elas podem gerar mal-entendidos e desavenças involuntárias. Tempo de cuidado, principalmente com o sentido de palavras repetidas nos debates políticos, mídias e conversas.
Será que procuramos compreender o significado delas, para um julgamento reto? Liberdade, democracia, fascismo e comunismo, direita e esquerda, corrupção, fake news… são apenas algumas em pauta no vocabulário popular do momento.
Sem propósito de fazer política partidária, defender esta ou aquela ideologia, influenciar no voto para este ou aquele candidato, é tempo de exortar ao uso consciente das palavras. Se para mais não for… para afirmarmos nossa humanidade. E isso exige esforço de compreensão e – por que não? – até pesquisa.
O conceito de liberdade, só para ilustrar a ideia, estará claro? Que é, afinal, liberdade? Quando se é livre?
Há muitas formas de ser livre, tipos diversos de liberdade. Algo, porém, é único e indiscutível: a liberdade é atributo exclusivamente humano.
Será?
Ora, os animais que vivem soltos nas florestas, sem limitações ou grades, não são livres? Estar em intimidade com a Natureza, cumprindo somente suas leis, de preservação e sobrevivência, talvez seja a síntese perfeita da liberdade.
Engano.
O mar não é livre e indomável, na grandiosidade de sua natureza e inconstância do seu temperamento? Nada pode tolher a liberdade dos oceanos.
Engano.
O que lhes falta, então, para que tenham liberdade?
Falta-lhes o elemento que está na essência do humano: a Razão. Eles carecem da racionalidade e apenas cumprem o seu destino – imutável – de estar no mundo. Aos animais, aos oceanos, aos não-humanos, cumpre ser como são e repetir, indefinidamente, o que lhes cabe fazer. Foram criados para isso e é isso que sempre farão.
Somente o ser humano tem a capacidade e possibilidade de escolher. Decidir por este ou aquele caminho, por esta ou aquela situação, pensando nas consequências de sua decisão e ponderando se vale a pena ou não o caminho a seguir.
Isso só o ser humano pode fazer. Só ele é livre para escolher e mudar escolhas, usando as faculdades mentais que possui, suas emoções e valores adquiridos.
Portanto, neste momento da Nação, o mais humano, racional e construtivo é refletir sobre os conceitos envolvidos nas propostas, nas palavras que circulam, no que elas revelam de quem as profere. Pensar no poder e potência das palavras. Para o Bem ou para o Mal.
É hora de não sermos distraídos. Hora de lembrarmos que as palavras são poderosas, sim, mas podem ser ocas. E quando vazias de significado ou incoerentes com as ações de quem fala, elas enganam. São falácias que podem nos conduzir a abismos.
Aí é que entra em cena a razão, a capacidade humana de pensar e decidir.
Pensamento, palavra e ação: refletir e discernir a coerência entre esses três componentes da racionalidade humana, isso é que leva ao exercício da real liberdade.
*Sonia Bittencourt: educadora e escritora – diretora da AJEB (Associação das Jornalistas e Escritoras do Brasil). Integra o Corpo Editorial da Oficina do Livro Editora, em SP.
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