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POLÍTICA

Justiça na Amazônia, utopia ou realidade?

Confira a coluna da Sylvia desta semana.

Em 07/06/23 13:59
por Coluna da Sylvia

Sylvia Colombo nasceu em São Paulo. Foi editora da Ilustrada, da Folha de S. Paulo, e atuou como correspondente em países como Reino Unido, Colômbia e Argentina. Escreveu colunas para o New York Times em Espanhol, o Washington Post em Espanhol, e integra os podcasts Xadrez Verbal e Podcast Americas. Entrevistou a vários presidentes da regão. Em 2014, participou do programa da Knight Wallace para jornalistas na Universidade de Michigan. É autora do "Ano Da Cólera", pela editora Rocco, sobre as manifestações de 2019 em vários países da regiõa. Vive entre São Paulo e Buenos Aires, enquanto viaja e explora outros países da Latam

Ato lembra um ano da morte de Dom Phillips e Bruno Pereira. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Familiares, amigos, imprensa e defensores dos direitos ambientais estiveram presentes nas distintas homenagens ao jornalista britânico Dom Phillips e ao indigenista brasileiro Bruno Pereira por conta do aniversário de um ano do assassinato de ambos, no Vale do Javari, na Amazônia, por parte de atores ligados ao garimpo e a pesca ilegais. Os atos aconteceram no Rio de Janeiro, em Brasília, em Londres e em outras cidades.
Se, por um lado, há uma grande dose de conforto ver que a rede de solidariedade formada por seus amigos e familiares em torno da tragédia continua viva, alimentando projetos, livro, documentários e, principalmente, promovendo ações para que o caso não perca visibilidade; por outro, não há praticamente notícias boas relacionadas a como continuam sendo ameaçadas as populações indígenas no Javari, ainda perseguidas e mortas pela ação do garimpo e da pesca ilegal.
Como a própria viúva de Dom, Alessandra Sampaio, disse, no evento carioca, “Toda a repercussão mundial, tudo o que se fez desde a morte deles, não chegou ainda a mudar algo para a população do Javari”.
Bruno Pereira, um homem que dedicou a vida a cuidar dos indígenas, os estava treinando a usar equipamentos de controle e vigilância para evitar que suas terras fossem invadidas de modo ilegal.
Dom Phillips, por sua vez, estava escrevendo um livro chamado “Como Salvar a Amazônia”. Ter sido perseguido e morto com um tiro nas costas demonstrou que essa é uma indagação muito incômoda para chefes de garimpo e pesca irregulares, assim como os que lideram cartéis de narcotráfico que atuam na região.
O histórico de ataques às terras indígenas exibido no bom documentário “Vale dos Isolados”, da Globoplay, dirigido por Sonia Bridi, infelizmente deixa um sabor amargo na boca de quem o assiste buscando algum sinal de que há avanços na preservação da floresta. O filme nos mostra o longo histórico da violência na Amazônia como uma contínua sucessão de assassinatos e massacres ocorridos nas últimas décadas, a maioria deles sem julgamentos ou condenações dos verdadeiros mandantes.
No caso de Dom e Bruno, há dois assassinos confessos esperando julgamento, mais o suposto mandante do crime, que foi indiciado nesta semana. Com a proximidade do julgamento, a defesa dos executores alterou sua versão. Eles agora afirmam que haviam confessado o crime num primeiro momento sob tortura e que Bruno havia atirado primeiro. Portanto, tentam emplacar uma nova narrativa na qual teriam agido em defesa própria _uma tese difícil de provar, mas que torna o julgamento mais intrincado.
Há, ainda, a questão política. Ninguém é ingênuo de pensar que esses assassinos atuaram sozinhos. E a continuidade da violência na Amazônia está diretamente relacionada com o histórico de encobrimentos e corrupção das autoridades locais.
Quando o presidente Lula foi eleito, a esperança de que a Amazônia passaria a ser uma preocupação real por parte do Estado projetou as demandas pela pacificação da região. De fato, no discurso com relação ao tema do meio ambiente, o ex-presidente Bolsonaro e o de Lula são completamente opostos.
Durante seu mandato, Bolsonaro retirou a proteção indígena e defendia a ideia de que a Amazônia deveria ser rentável. O desmatamento aumentou. Quando saiu a notícia de que se haviam descoberto os corpos, Bolsonaro foi capaz de dizer que Dom e Bruno entraram numa área não autorizada e que eram os responsáveis por sua morte, ao buscar uma “aventura”, sem estarem preparados.
Lula, após eleito, mostrou interesse em mudar essa situação e anunciou investimentos e ações locais, além de levar essa intenção a vários líderes europeus.
Afinal, a Amazônia protegida do desmatamento e da violência é praticamente um requisito pelo tão buscado acordo Mercosul-União Europeia.
Entre as coisas que se fez nesse início de mandato, está o envio de ajuda para ajudar os Yanomami a expulsar dezenas de milhares de exploradores ilegais de ouro de suas terras.
Na última segunda-feira (5), durante a cerimônia de comemoração do dia do Meio Ambiente, Lula voltou a anunciar medidas de proteção aos indígenas, como a ampliação de meios navais que patrulham os rios da Amazônia, compra e modernização de equipamentos e aumento da presença do Exército nas fronteiras para tentar frear a disparada do narcotráfico entre os países da Amazônia Real. Lula também enfatizou a questão econômica, afirmando que, sim, a Amazônia pode ser preservada e, ao mesmo tempo, ter um papel na produtividade do país por meio de suas riquezas.
São boas notícias, mas Lula se encontra hoje com as mãos atadas para avançar com a legislação necessária para pôr em prática uma reforçada segurança para os povos indígenas. Seu enfraquecimento ante o Congresso ficou notória diante do voto conservador dos deputados com relação ao marco temporal _um retrocesso histórico que deixará várias tribos expostas aos avanços das máfias.
O projeto ainda será votado no Senado, onde infelizmente são poucas as chances de não-repetição do voto da Câmara.
Na cerimônia no Rio de Janeiro, o líder indígena Beto Marubo, amigo de Bruno, afirmou que, em sua terra, “absolutamente nada mudou”. E que já não estavam interessados nas boas intenções: “Queremos ver as coisas acontecerem”.
No emotivo encontro no posto 6 de Copacabana, onde Dom adorava praticar paddle surf, o ambiente nesta segunda era de tristeza e planos de luta, vêm aí um o livro que Dom deixou sem terminar, e que agora será completado por amigos, também um outro documentário, de produção estrangeira, além de mais atos para deixar a causa circulando e acesa.
Ainda que as esperanças sejam poucas de que se faça 100% de Justiça e de que a violência cesse na região, predomina entre ambientalistas e mesmo no discurso de Marina Silva, que resiste, ainda que enfraquecida, no governo, a ideia de seguir lutando.
Neste momento de alta visibilidade internacional da Amazônia, o governo brasileiro tem uma chance histórica para oferecer soluções a indígenas e ribeirinhos, para acabar com as lutas fratricidas, que se desmontem as máfias e que se deixe de desmatar a Amazônia.

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