Política

ASTRAZENECA E COVAXIN

Denúncias de propina pressionam governo federal

Líder do governo na Câmara, Ricardo Barros é citado em dois casos de suborno envolvendo a negociação de vacinas contra a covid-19

por Sara Goldschmidt em 08/07/21 10:38

A madrugada desta quarta-feira (30) foi considerada a mais fria do ano em todo o País, mas parece que em Brasília a temperatura subiu um pouco. Duas denúncias de propina vieram à tona nesta terça-feira (29) à noite, ambas envolvendo a negociação de vacinas contra a covid-19 e o governo federal – mais precisamente o Ministério da Saúde e o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP/PR).

Líder do governo na Câmara, Ricardo Barros
Líder do governo na Câmara, Ricardo Barros. Foto: Antonio Cruz (Agência Brasil)

O primeiro relato é do representante de uma vendedora de vacinas, que afirmou ao jornal ‘Folha de S.Paulo’ ter recebido o pedido de suborno de US$ 1 por dose da AstraZeneca em troca de fechar contrato com o Ministério da Saúde.

Luiz Paulo Dominguetti Pereira, que se apresenta como representante da empresa Davati Medical Supply, disse que o então diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, cobrou a propina durante um jantar em Brasília, no dia 25 de fevereiro.

Roberto Dias teria sido indicado ao cargo pelo líder do governo de Jair Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros. Barros nega que a indicação tenha sido dele.

Segundo a Folha, a empresa Davati buscou o Ministério da Saúde para negociar 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca, com uma proposta feita de US$ 3,5 por cada (depois disso passou para US$ 15,5). Aqui, um parênteses: não se tem a confirmação de que a Davati tinha autorização para negociar o imunizante da AstraZeneca.

Ao jornal, Dominguetti afirmou que naquela ocasião, “o caminho do que aconteceu nesses bastidores com o Roberto Dias foi uma coisa muito tenebrosa, muito asquerosa”. Ele deu detalhes: “eu falei que nós tínhamos a vacina, que a empresa era uma empresa forte, a Davati. E aí ele [Roberto Dias] falou: ‘olha, para trabalhar dentro do Ministério, tem que compor com o grupo’. E eu falei: ‘mas como compor com o grupo?”. Dias teria respondido que existe um grupo que só trabalhava dentro do Ministério, então se a empresa Davati conseguisse aumentar o valor da vacina, colocar um valor diferente do que a proposta original, a pasta fecharia o contrato.

“Pensa direitinho, se você quiser vender vacina no Ministério tem que ser dessa forma”, teria dito o então diretor ao representante da empresa. A Folha então perguntou qual seria essa “forma”. “Acrescentar um dólar”, respondeu Dominguetti. Segundo ele, US$ 1 por dose.

Essa reunião teria acontecido um dia após o Brasil ter atingido a marca de 250 mil mortos por covid-19.

Seis centavos de dólar por dose de Covaxin

Outra denúncia foi feita pela ‘Revista Crusoé’. Segundo o veículo, interlocutores afirmam que o deputado federal Luis Miranda (DEM/DF) teria recebido oferta de propina de Ricardo Barros e de um lobista, para não atrapalhar as negociações da Covaxin.

O deputado teria sido convidado para uma reunião em Brasília pelo lobista Silvio Assis, 11 dias depois dele e seu irmão – servidor do Ministério da Saúde – terem alertado o presidente Jair Bolsonaro sobre as supostas irregularidades no processo de compra da vacina indiana. Assis é conhecido da Polícia Federal por envolvimento em outros esquemas de corrupção, e é amigo de longa data de Ricardo Barros.

Na ocasião, o lobista teria explicado a Miranda que nada poderia dar errado no negócio da Covaxin e tentou persuadi-lo a convencer o irmão a parar de criar embaraços para o negócio. Teria dito, inclusive, que o deputado poderia ser recompensado caso topasse ajudar na empreitada – sem falar em valores, disse que, se tudo desse certo, a reeleição do parlamentar estaria garantida.

Pouco mais de um mês depois deste primeiro encontro, já em maio, Luis Miranda teria sido procurado novamente. A reunião foi no mesmo lugar, uma casa no Lago Sul, em Brasília. Desta vez, Ricardo Barros estava presente. A pauta era a mesma também, mas agora envolvia valores. Silvio Assis prometeu ao parlamentar uma participação sobre cada dose da vacina que seria vendida ao Ministério da Saúde: seis centavos de dólar. Ou seja: se aceitasse a “parceria”, Miranda poderia levar um milhão e duzentos mil dólares – ou seis milhões de reais –, caso a venda das 20 milhões de doses da Covaxin fosse formalmente concluída.

O deputado teria negado a proposta e disse aos interlocutores não acreditar que a oferta de propina que recebeu tenha relação com a conversa que teve, dias antes, com o presidente da República para denunciar irregularidades no processo de compra da vacina.

O que disse Luis Miranda

À ‘Revista Crusoé’, o deputado disse que prefere não se manifestar sobre as conversas que teve com o lobista e com o líder do governo. Ele afirma que prefere falar sobre o assunto para a Polícia Federal, se for chamado.

O MyNews entrou em contato com a assessoria do parlamentar nesta quarta-feira (30) pela manhã, mas ele disse que não irá comentar o assunto.

Íntegra do programa ‘Café do MyNews‘ desta quarta-feira (30), que abordou o suposto esquema de corrupção na compra de vacinas.

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