Maria Aparecida de Aquino

POLÍTICA

O dia que durou 21 anos

Este é o título do fantástico longa-metragem/documentário 2012, dirigido pelo cineasta Camilo Tavares (1971- ), nascido na Cidade do México, vivenciando sua infância na Argentina e chegando ao Brasil somente em 1979

por Maria Aparecida de Aquino em 20/04/23 19:06

2012 (Foto: Reprodução)

Este é o título do fantástico longa-metragem/documentário (2012- à disposição no YouTube) dirigido pelo cineasta Camilo Tavares (1971- ), nascido na Cidade do México, vivenciando sua infância na Argentina e chegando ao Brasil somente em 1979, onde foi morar, no Rio de Janeiro. Hoje, encontra-se radicado em São Paulo. Essa trajetória em diferentes países se deve ao exílio de seu pai, o magnífico jornalista Flávio Tavares (1934- ) que faz a narração do filme.

Flávio Tavares trabalhou no importante jornal Última Hora de Samuel Wainer que promoveu uma verdadeira revolução na imprensa brasileira. Depois, já no exílio, colaborou com o jornal mexicano Excelsior e, em Buenos Aires, escreveu para O Estado de S. Paulo. Seu exílio se deveu à sua participação em grupos de luta armada como o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR) e o Movimento Armado Revolucionário (MAR). Foi preso e, em 1969, um dos prisioneiros políticos soltos em troca do embaixador estadunidense Charles Burke Elbrick que havia sido sequestrado. Aí tem início seu exílio e de sua família.

Camilo Tavares realizou um filme que se diferencia muito de outras obras sobre a Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Graças a uma pesquisa em arquivos da CIA e em áudios da Casa Branca dos EUA, documenta claramente o interesse estadunidense e a participação no golpe ilegal e ilegítimo que nos vitimou em 1964, dando início ao pesadelo de 21 anos.

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A se registrar as falas do presidente John Fitzgerald Kennedy (1917-1963), de seu sucessor Lyndon B. Johnson (1908-1973), do embaixador dos EUA no Brasil à época Lincoln Gordon (1913-2009), de seu assistente Robert Bentley e não se pode esquecer da figura de Vernon Walters, adido militar dos EUA no Brasil e amigo do Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. Ele influenciou na escolha do militar para ser o primeiro presidente da ditadura instaurada em 1964. Todos eles conspiradores contra o governo legítimo de João Goulart e articuladores do golpe que o derrubou.

Cada qual a seu modo contribuiu para a paranoia de que João Goulart estaria disposto a transformar o Brasil em uma nova Cuba comunista, através do lançamento de uma “República Sindicalista”. Qualquer semelhança com a atualidade não é mera coincidência. Ao se pensar na atuação da mídia na época e seu papel golpista, basta traçar uma comparação com a mídia atual em relação ao governo do presidente legitimamente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Houve um certo namoro dos meios de comunicação em relação ao governo atual do presidente Lula, namoro este acentuado quando da tentativa criminosa de golpe de Estado contra a democracia em 08/01/2023, através da turba ignara destruidora no Congresso Nacional, no Supremo Tribunal Federal, no Palácio do Planalto. O dia seguinte mostrou algo absolutamente inédito. Independentemente das tendências e do apoio ou oposição ao atual governo, parlamentares, governadores, congressistas todos se uniram na mais bela imagem que o Brasil produziu depois da caminhada até a posse de Lula.

Porém, o namoro durou pouco. Ninguém se incomodou com a ida de Lula à Argentina e aos EUA. Mas…ir à China? Convenhamos. Isto foi demais!

Novamente precisamos recorrer à comparação. Quando o malfadado senhor Jânio Quadros renunciou onde estava João Goulart, seu vice? Na China. Os que tem memória sabem da dificuldade e da negociação que foi preciso fazer com militares e conservadores de plantão para que ele pudesse retornar e assumir o posto que lhe era de direito, o de Presidente da República. Mesmo assim, só aceitando a fórmula do Parlamentarismo para diminuir seus poderes.
No filme aparece claramente delineado o peso hercúleo que os EUA tiveram naqueles tenebrosos momentos de articulação e efetivação do golpe de 1964, inclusive em um de seus mais desonrosos episódios: a declaração de vacância da presidência da República na presença no país do presidente legitimo, João Goulart.

Agora, até mesmo os comentaristas que parecem minimamente esclarecidos (com honrosas exceções) ficam debulhando as falas do presidente Lula para criticá-las duramente. Afinal, ele foi à China! Pecado mortal!
O filme O dia que durou 21 anos deve ser visto por todos: os de direita, de esquerda, de centro e os que não sabem o que são, mas no fundo são alguma coisa. Visto para que não se repitam, tanto influências estrangeiras mal- intencionadas, como conspirações contra a democracia que foi um bem duramente conquistado e ainda se encontra em fase de consolidação no Brasil.

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